Quando se fala em ergonomia, a primeira imagem que vem à mente é uma cadeira com apoio lombar ou um monitor na altura dos olhos. Embora esses aspectos sejam importantes, eles representam apenas a ponta do iceberg. A verdadeira ergonomia é uma ciência vasta e complexa que trata da adaptação da atividade ao indivíduo em todas as suas dimensões.
A auditora fiscal do trabalho Ana Luiza Orcades esclarece que a ergonomia vai muito além do físico, abrangendo três grandes áreas que se interconectam e afetam diretamente a saúde e o desempenho dos trabalhadores:
- Ergonomia Física: Essa é a parte mais conhecida, que se concentra nos aspectos biomecânicos, posturais e de esforço físico. Envolve a adequação das dimensões do posto de trabalho, iluminação, ruído e conforto térmico.
- Ergonomia Cognitiva: Trata dos processos mentais relacionados ao trabalho, como a tomada de decisão, o tempo de reação e a forma como a informação é processada. Problemas nessa área podem surgir de sobrecarga de informações, tarefas confusas ou a falta de clareza nas rotinas.
- Ergonomia Organizacional: Foca em sistemas sociotécnicos, incluindo a estrutura organizacional, políticas e processos. Questões como a comunicação interna, a fragmentação do trabalho (onde o trabalhador não vê o resultado final de sua contribuição) e a falta de reconhecimento afetam essa dimensão. É aqui que os fatores de risco psicossociais ganham destaque.
A Conexão com a Saúde Mental
Essas três dimensões não são isoladas; elas se influenciam mutuamente. Um ambiente de trabalho psicologicamente estressante, com lideranças tóxicas ou metas inatingíveis, pode gerar problemas físicos, como dores crônicas ou lesões por esforço repetitivo. Como a especialista ressalta, “tristeza dói”. O absenteísmo frequente por dores inespecíficas, por exemplo, pode ser um reflexo direto de um sofrimento emocional ou psíquico.
A Nova Lógica de Gestão de Riscos: NR-1 e NR-17
A NR-17, norma que trata da ergonomia, serve como o documento normativo de base para orientar a gestão de riscos ergonômicos e psicossociais. Ela é a primeira fonte para entender como identificar perigos, avaliar riscos e implementar medidas de controle nesse contexto.
A NR-1, por sua vez, é a norma que estabelece o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e exige a sistematização de todos os registros de risco no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).
A nova legislação, que entrou em vigor em maio de 2022, não inventou a roda; ela apenas reforçou a obrigação legal que já existia: toda organização deve gerenciar os riscos de forma holística, incluindo os fatores psicossociais. O PGR é o documento que unifica todas as informações sobre riscos (físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e psicossociais), mostrando que a empresa está atuando de forma estratégica e responsável para proteger a saúde de seus colaboradores.
Ignorar os fatores de risco psicossociais no PGR, na esperança de “não gerar provas contra si mesmo”, é um erro grave. A ausência de um mapeamento e de um plano de ação demonstra o não cumprimento da lei, o que pode resultar em multas e até interdições por parte da auditoria fiscal do trabalho. A segurança está justamente em ter um processo de gestão de riscos claro, com prioridades definidas com base em uma avaliação técnica e científica.